domingo, maio 06, 2007

Há que se crer na natividade da morte

Essa semana me deparei com dois episódios de perda de pessoas queridas que me levaram a uma reflexão a cerca da vida e da morte.

Recebi há algum tempo um email, como desses que recebemos as dezenas diariamente de diversas pessoas, e achei o texto muito interessante. O texto falava sobre a vida, comparando-a com uma viagem de trem. E ai, me arvoro da condição de plagiador do enredo do referido texto para extrapolar um pouco e comparar nossa existência entendendo-a não como vida , mas como existência infinita, onde temos uma alma imortal que creio viajar em uma jornada sem fim onde fazemos várias paradas em diversas estações.

Nessas paradas muitas pessoas entram e saem do mesmo vagão que nós. Muitas fazem diferença e influenciam nossa viagem, outras não, são apenas transeuntes do destino. Quase sempre uma delas senta ao nosso lado e compartilha da viajem conosco, conversando e observando a paisagem que se descortina na janela, nos ajudando a compreender as coisas, deixando que cochilemos no seu ombro, sendo verdadeiros parceiros da jornada. Outras vezes, a grande maioria, entra no mesmo vagão que nós, mas nem se dá conta que lá estamos, às vezes até nos são mal educados, pisam nos nossos pés, nos empurram, nos molham com seus guarda-chuvas molhados sem sequer pedir licença ou desculpas, disputando pelo melhor lugar do vagão para usufruir egoisticamente de sua viajem, sem importar com os que precisam por diversas razões de condições mais confortáveis, às vezes até indispensáveis para chegar até o fim da viajem.

Mas uma coisa para mim é muito certa, essa viagem, como todas as outras nos levará a algum lugar, pois não consigo conceber um trem cheio de gente, conduzido por alguém que conhece todos os caminhos, e que chegando ao final dos trilhos simplesmente parará, em um lugar escuro, vazio de tudo, onde permaneceríamos estáticos, esperando pelo nada, que para mim, e para a física moderna não existe.

Penso que esse trem nos levará a algum lugar, onde apenas desconfio onde seja, baseado em minhas crenças pessoais, e que lá no final da jornada desembarcaremos todos, e encontraremos algo, mas o que muito mais me importa não é o que me aguarda no final da viagem, mas sim como nos comportamos durante o trajeto.

Muito mais me importa o comportamento que temos com as pessoas que sentam ao nosso lado na jornada, as conversas que travamos, os conhecimentos que compartilhamos, o que cedemos e o que recebemos, a tolerância com o próximo, a gentileza que nada nos custa. Penso inclusive, ai mais uma vez baseado em minhas crenças pessoais, crenças essas que são compartilhadas por bilhões de pessoas em todo o mundo, desde os cristãos que crêem no céu aos muçulmanos que esperam pelas suas quarenta virgens no paraíso, e que essa conduta nos garantirá algum bônus pelo bilheteiro no final da viagem.

Penso que a forma como nos comportamos e agimos nessa vigem é que faz a grande diferença. Não podemos ser apenas expectadores da paisagem, colocando a cabeça para fora da janela para fugir do cheiro que exala do interior do vagão. Precisamos todos ser agentes de mudança nas condições interiores desse ambiente partilhado por todos, e quando pudermos, conversarmos com o motorneiro pedindo a ele que o trem siga rumos onde as paisagens sejam mais agradáveis.

Não temo o que vou encontrar no final da jornada, até porquê creio de fato na natividade da morte, e que essa vida é apenas mais uma parada em uma das várias estações da jornada, apenas queria que essa viagem fosse mais agradável a mim e a todos com os quais compartilho-a.

Às vezes nos vemos cansados e gostaríamos de sentar um pouco, trocando de lugar com os que chegaram mais cedo na estação e conseguiram um lugar na janela, pessoas que sentaram primeiro e pouco se importam com a mãe que carrega nos braços uma criança que chora faminta, uma senhora já idosa cheia de sacolas, um senhor apoiado em um par de muletas. Sejamos mais solidários na viajem, e principalmente cuidemos todos desse trem pois pode ser que sem os cuidados necessários ele fique pelo caminho apesar da sapiência e habilidade do condutor, mas acima de tudo, compartilhemos os lugares nas janelas para que todos possam apreciar a beleza das paisagens... Para que todos possam ver o Sol e as Flores Amarelas do caminho...

Quero ver todos vocês sentados na poltrona ao lado da minha durante toda a viagem, apreciando a paisagem, sorrindo, e às vezes chorando, junto comigo, conversando e contando histórias sobre as coisas que veremos, aprendendo uns com os outros e escrevendo um diário de viagem onde certamente registraremos muitas páginas de felicidade.

Ricardo Sérgio

Saudações fraternas e ecológicas

terça-feira, março 20, 2007

голубая земля ! ou... a Terra é azul !

Até quando poderemos reafirmar a tão famosa e conhecida constatação de Yuri Gagarin, cosmonauta russo que em 12 de abril de 1961 a bordo da espaçonave Vostok I confirmou ser a terra coberta por 70% de água, colorindo com os mais variados matizes de azul a superfície do nosso planetinha ?

Até onde vai a ignorância do homem com relação ao uso irresponsável dos recursos naturais, sobretudo do mais importante e essencial deles, a água, fonte da vida, origem de tudo ?

Até quando vamos continuar a nos comportar como vírus ? Como organismos que insanamente são capazes de destruir o hospedeiro que lhe sustenta a vida ?

O ser humano, historicamente vem demonstrando o quanto é estúpido e ignorante destruindo florestas, extinguindo pessoas, plantas e animais, numa velocidade tão grande que às vezes nem chega a lhes conhecer a existência e o valor. Plantas onde talvez residissem a cura de muitas doenças, quase sempre causadas pela desarmonia do todo, causadas pelo desequilíbrio do meio, pelo próprio homem, como se não fosse ele parte do próprio meio.

Permitam-me os companheiros fazer uma analogia talvez simplória mas certamente bastante esclarecedora. Que dona de casa em sã consciência dispondo de apenas de 2,5% do total do orçamento doméstico para administrar todas as necessidades de sua família desperdiçaria esses parcos recursos priorizando a compra de cosméticos no lugar de alimentos para sua prole ?

Pois é o que acontece conosco, donos da casa chamada Planeta Terra, pois do total da água existente no globo 97,5% é salgada, e para complicar ainda mais a vida de nós homo “que se acha” sapiens do total de 2,5% da água doce existente, a maior parte encontra-se concentrada nas calotas polares em forma de gelo, ou seja, encontra-se acessível apenas àqueles dispostos a caminhar bastante sob um frio de -40ºC para tomar um uísque on the rocks.

Apenas algo em torno de 0,3% de toda água existente na terra encontra-se nos rios, lagos e lençóis subterrâneos, ou seja, disponível para os mais variados tipos de consumo, sendo que desse total 12% encontra-se no Brasil, o que só reforça minha teoria de que Deus definitivamente adotou o Brasil como sua pátria. E só para complicar ainda mais, desse total de água disponível no Brasil, 80% está concentrada na região amazônica onde mora apenas 5% da população.

Outro dado relevante é que no ano zero da era cristã a população mundial correspondia a 3% da população atual. Hoje somos mais de 6 bilhões de pessoas enquanto a disponibilidade de água permanece a mesma de dois mil anos atrás. As novas tecnologias, na contramão da razão aumentam a demanda do consumo de água, chegando as classes abastadas a gastarem mais de 500 litros/dia per capita, em contrapartida à média das populações africanas que usam menos de 10 litros/dia, denotando a gritante injustiça na distribuição dos recursos materiais em nosso planeta. Soma-se a essas constatações estúpidas o fato de que 30% de toda água tratada e distribuída pelas companhias de água brasileiras são desperdiçadas em vazamentos. Quanta insanidade...

Falam alguns estudiosos do assunto que a continuar no ritmo que estamos, em 20 anos faltará água para 60% da população mundial. Segundo o Prof. Pasquale Steduto, especialista da ONU em gestão de recursos hídricos, mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo já não têm acesso a água limpa suficiente para suprir as suas necessidades básicas diárias.

Ufa ! É um sem número de números que expressa o quanto é preciso sermos responsáveis e acordarmos para o mal que estamos perpetrando a nós e a nosso planeta. É um sem número de números que demonstra inequivocadamente a importância de preservarmos o recurso natural mais precioso disposto por Deus à nós. É um sem número de números que prova o quanto somos estúpidos e não conseguimos enxergar o tamanho da enrascada em que estamos nos metendo, que este é um caminho sem volta, e que a água é um recurso finito.

Até quando vamos continuar a nos comportar como vírus ? Até quando vamos prosseguir com esse processo de esgotamento dos recursos naturais ? Seremos tão estúpidos ao ponto de levar a morte o nosso hospedeiro em uma atitude claramente suicida ? Quando vamos finalmente compreender o conceito que há por trás da palavra sustentabilidade ?

Até quando vamos poder reafirmar a constatação do cosmonauta Yuri Gagarin, que estupefato diante de toda beleza descortinada da minúscula janela da espaçonave Vostok I, cunhou com uma poética simplicidade a célebre frase голубая земля ! ou... A Terra é Azul !

quarta-feira, março 14, 2007

Reforma política e voto facultativo

Acompanhando os diversos comentários que tem circulado incessantemente nos vários blogs, revistas e jornais a respeito da reforma política, resolvi não me furtar ao direito de contribuir com minha reflexão a cerca do tema.

A primeira consideração que gostaria de fazer é que avalio ser muito ruim para a consolidação e evolução do processo democrático brasileiro que somente em face do turbilhão de acontecimentos vivenciados pelo meio político nos últimos meses, é que a sociedade tenha se visto compungida a refletir e se posicionar a respeito dessa questão, pois somente diante dos escabrosos fatos expostos pelos Jefersons da fauna política tupiniquim, o povo brasileiro acordou para a necessidade de se buscar um modelo eleitoral que privilegie os interesses mais nobres, dele eleitor, verdadeiro e legítimo mandatário dos destinos de nossa nação.

Diante de todos os fatos e factóides expostos pelas estruturas midiáticas, muitas vezes a serviço de interesses subalternos que obedeciam a estratégias de manutenção do poder de determinados grupos políticos e econômicos, o eleitor brasileiro, tal qual o marido traído da piada que é sempre o último a saber, se viu surpreendido e estupefato com diversos fatos para ele chocantes, como se desconhecesse ou nunca tivesse ouvido falar do que historicamente acontece nos bastidores da política brasileira.

Ainda tal qual o marido traído da piada, o eleitor brasileiro constatou surpreendido, estar sendo enganado pelos que deveriam ser os principais e fiéis depositários de seus mais elevados interesses políticos, representado-os e defendendo-os em retribuição ao voto de confiança sufragado nas eleições diante das promessas e compromissos assumidos nos diversos palanques eleitorais. Afinal é função precípua dos possuidores de mandatos zelar pela ética no trato da coisa pública resguardando os interesses da coletividade que o elegeu.

E depois do furacão que solapou o cenário político nacional, depois das feridas expostas pelos vários escândalos, restou como resultado dessa indignação a tardia constatação que apenas 35% da população conhece o funcionamento e se diz satisfeita com o atual sistema político eleitoral brasileiro.

E como de regra, a sociedade brasileira que se movimenta apenas diante de fatos que a chocam, haja vista o caso do garoto João Hélio, ligou o sinal de alerta e acionou todas as sirenes estabelecendo um caráter de urgência à discussão de uma proposta que viesse estabelecer a transformação do modelo eleitoral vigente, criando uma frenética discussão na sociedade a cerca da necessidade de uma reforma política que busque estabelecer novos patamares na relação entre o povo e seus representantes, onde os últimos se vejam chamados à responsabilidade diante dos que os lá colocaram através do voto.

As acaloradas discussões recentemente estabelecidas trouxeram a baila temas como fidelidade partidária, financiamento público de campanhas, proibição de coligações em eleições proporcionais, voto distrital, voto em listas fechadas, redução dos mandatos de senadores de 8 para quatro anos, cláusula de barreira para impedir a existência das legendas de aluguel, fim da remuneração para vereadores de cidades com menos de 100.000 habitantes, redução do número de senadores de 3 para 2 por estado, coincidência dos calendários eleitorais, enfim, um sem número de propostas e idéias, algumas ao meu ver coerentes e outras estapafúrdias e inconstitucionais, a exemplo da proposta da cláusula de barreira que versa sobre a extinção de siglas partidárias pequenas, mas muitas vezes significativas e imprescindíveis ao cenário político nacional. É certo que algo precisa ser pensado no sentido da coibição da prática da criação de pequenos partidos que servem unicamente como trampolins eleitorais para determinados grupos ou personalidades políticas, possibilitando absurdos como a volta ao cenário político do Sr. Fernando Color de Mello dentre outras aberrações eleitorais.

Mas um tema que não tenho visto ser discutido, e ai vem a provocação, ao menos com a mesma amplitude e intensidade das temáticas supra citadas é o voto facultativo. Penso que apesar das distorções e dicotomias políticas ainda vivenciadas pela sociedade brasileira, e que apesar de todos os vícios político/eleitorais vivenciados pelos candidatos e eleitores, detemos maturidade política suficiente para incorporar o voto facultativo no rol das propostas discutidas na reforma política.

Penso inclusive que o voto facultativo, junto com outras iniciativas como o voto em lista e a fidelidade partidária, viriam no sentido do fortalecimento das estruturas dos partidos, fazendo com que o eleitor passasse a se interessar mais e participar ativamente, acompanhando com mais crença e senso crítico as ações dos seus representantes nas várias instâncias legislativas.

Tenho observado no povo brasileiro uma vontade crescente de participação política que seria qualificada com o voto facultativo, dificultando o processo de “arrebanhamento” de eleitores desinformados pelos maus políticos, quebrando assim uma das principais estratégias de manutenção do poder dessas elites, ainda dominantes, sobretudo nos municípios menores, onde a informação, conscientização e capacidade de mobilização e organização política são ainda sonhos distantes da maioria das pessoas e organizações da sociedade civil.

É preciso insistir no sentido da evolução desse falido sistema de Democracia Representativa atualmente vigente, para uma Democracia Participativa, onde se estabeleçam mecanismos de participação popular que se auto regulem e evoluam constantemente, garantindo a efetiva participação do Cidadão na condução dos destinos do Brasil tornando-os, eles eleitores, povo brasileiro, sujeitos de seus destinos, e esse processo de empoderamento passa necessariamente por uma reforma política ampla, num debate franco e democrático com todas as estruturas da sociedade.

Saudações Fraternas e Ecológicas.

quinta-feira, março 08, 2007

Infâncias Roubadas...

Ontem como de costume, no trajeto até o trabalho me deparei com uma realidade cotidiana que por mais cotidiana que me seja, sempre me choca e me indigna. A realidade das dezenas de crianças mendigando moedas nos semáforos, das milhares de crianças que tem cotidianamente suas infâncias roubadas.

Mas ontem em especial algo me comoveu e mexeu comigo ainda mais, muito além do que me comove e me revolta todos os dias quando deparo com essa cruel realidade. Ontem, dentre as várias crianças que perambulavam entre os carros em busca de uma moeda que pudesse servir de lenitivo a sua fome, havia uma criança com um sorriso e um olhar diferente, ou talvez meu olhar estivesse diferente à questão no dia de ontem, não sei.

Apenas sei que aquele sorriso diferente, diferente dos outros de todos os dias, talvez até na mesma face, me desafiou a mais uma vez refletir a respeito desse problema que sempre me inquieta. Mas dessa vez essa inquietude me fez ir além, me fazendo partir para o insistente exercício da escrita nesse espaço virtual. Dessa vez, minha inquietação me fez buscar com vocês companheiros de Blog e de indignação a reflexão a cerca dessa questão, me fazendo ponderar a cerca do que eu tenho feito, do que nós sociedade temos feito e poderíamos fazer no sentido da erradicação dessa mazela além de dar esmolas. Que me perdoem os sociólogos e assistentes sociais de plantão, mas eu me declaro sem nenhum constrangimento um doador de esmolas.

Tenho a convicção e clareza de que pouco contribuo com esse ato, tanto que procuro sempre me engajar em desafios que busquem esse enfrentamento de forma mais sistêmica e estruturadora, mas a esmola para mim é uma questão pessoal, íntima, dogmática, e que me critiquem os que quiserem, a mim e a Dom Helder Câmara que também era um adepto do óbulo aos necessitados.

E além do mais, numa análise conjuntural e mais profunda há que se considerar que diante da gravidade e da enormidade do problema, tudo o que a sociedade tem feito na verdade, não passa de esmola, as vezes moral, as vezes material, mas ainda esmola, quase sempre compensatória, quase sempre no sentido de aliviar seu sentimento de culpa diante do próprio imobilismo.

E essa inquietação que me tomou, me faz questionar até quando seremos, nós sociedade brasileira, ladrões de sorrisos, ladrões de infâncias.

Acho inclusive que o crime de roubo de infâncias deveria ser enquadrado na Lei de Crimes Hediondos, pois nada há mais hediondo que se roubar o sorriso e a alegria de uma criança, nada mais hediondo que se roubar a oportunidade do crescimento de um adulto completo, de um ser integral, pois que sem essa fase fundamental da vida, nos tornamos algo que não humano, um arremedo de gente, que não aprendeu a sorrir, pois é lá, na infância que se aprende algo tão fundamental.

E em se enquadrando como um crime hediondo, uma punição severa deveria recair sobre os que perpetram tão abominável crime contra a humanidade, pois o intangível que se rouba nesse caso, é raro, precioso, único, tão importante e fundamental quanto o cálcio contido no leite necessário ao bom crescimento ósseo de nossas crianças, quanto o ferro contido no feijão, base de nossa alimentação, quanto as proteínas das carnes tão raras na maioria das mesas brasileiras, pois tanto quanto tudo isso, indispensável a sobrevivência do corpo, o ser para ser humano, precisa de sorrisos, de alegria, de ser criança um dia, precisa das coisas da infância para se construir adulto, para se construir humano.

Quando lhe faltam os nutrientes do corpo quase sempre se cresce um adulto raquítico , frágil, despreparado para as lutas cotidianas, para a competição infligida pela insana luta pela sobrevivência desse mundo mercantilista.

E quando lhe falta a alegria de ser criança ? Os sorrisos e as descobertas inerentes a essa fase da vida ? O lúdico, os sonhos ? Que deficiências do caráter e da alma vão aflorar nesse adulto ? Quais raquitismos morais e éticos se farão presentes nessa pessoa.

E aí reitero a reflexão. Até quando nós, sociedade brasileira, vamos continuar a roubar impunemente os sorrisos das faces de nossas crianças ?

Reconheço que avanços houveram a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente. Reconheço que algo se tem feito, sobretudo pelas instituições da sociedade civil e por instituições como o UNICEF/UNESCO, pouco pelos governos e legisladores, mas uma distância abissal ainda separa essa dura realidade do sonho de não termos mais crianças nas ruas, nos lixões, sobrevivendo em favelas, fora da escola, desnutridas, agredidas, agressoras, violadas, violentas, assassinadas e assassinas, traficantes e vítimas do tráfico, assaltantes e assaltadas nos seus direitos básicos e fundamentais, no seu direito de ser criança, como se criança não fosse, como se fossem adultos que não tiveram infância e se tornaram em algo que não humano, num arremedo de gente, muitas vezes cruel, fria, desumana, que desrespeita a tudo e a todos e desafia a sociedade rumando para a marginalidade, que não sabe amar porquê desconheceu o que é ser amado quando criança, que não sabe sorrir porquê não aprendeu a sorrir quando criança.

Quem de nós, privilegiados que tivemos infância não lembra dos momentos mágicos e únicos vividos nessa etapa de nossas vidas ? Dos sonhos, alegrias, descobertas, aventuras, brincadeiras e músicas que povoam nossas memórias mais doces, amizades sinceras... Quem não tem uma boa recordação de sua infância ?

No instante que se discute a redução da maioridade penal, acho que seria mais prudente se discutir em um debate amplo e franco na sociedade, o aumento da responsabilidade de cada um com essa questão.

Até onde somos responsáveis individual e coletivamente por esse quadro desolador posto diante de nós ? Não estaremos dando tiros nos próprios pés, tiros na própria alma quando negamos a milhares de crianças o direito de ser criança ? Quando negamos a milhares de pessoas o direito de serem humanos, inteiros, completos, um dia criança, depois jovem, adulto e idoso, com seus direitos e deveres garantidos em cada etapa de suas vidas, fechando o ciclo que forma o ser humano integral, o ser humano cidadão ?

Saudações fraternas e ecológicas.

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Feliz Ano Novo, Feliz Homem Novo

Nesse período do ano, no limiar de mais uma jornada, quando nos despedimos do ano velho e diante da perspectiva do novo, do imponderável, do desconhecido, dos desafios que virão, e que ainda nos são quase sempre desconhecidos, normalmente nos vemos fazendo uma avaliação de tudo que se passou no ano que finda, como se fosse a exibição de um curta metragem de nossa vida, onde pegamos um trecho desse longo filme, realizado quadro a quadro nas lutas cotidianas, resultado de nossas vivências, alegrias e tristezas, coisas boas e ruins, filme onde quase sempre somos o protagonista, às vezes o diretor, e algumas vezes apenas ator coadjuvante.

E normalmente nessa época, diante da exibição desse curta, nos transformamos em espectadores de nossa própria vida, observando e avaliando tudo que nos aconteceu no ano que acaba, sobretudo as coisas ruins e os erros cometidos, por nós, e nos arvorando da condição de juízes, os erros cometidos pelos outros em nossas vidas. Avaliamos as conquistas e as perdas, para que nessa reflexão busquemos no ano vindouro errar apenas erros novos e conquistar aquilo que não atingimos.

E diante dessa reflexão, quase sempre nos vemos fazendo as tais Resoluções de Ano Novo, onde afirmamos a nós mesmos que no próximo ano tudo vai ser diferente, que aquela dieta que não conseguimos começar nas várias segundas-feiras do ano que acabou, dessa vez vai, e assim, vamos perder peso e nos enquadrar no padrão estético vigente, talvez até uma academia de ginástica, uma plástica, um botox quem sabe.

Nos vemos dizendo que "esse ano vou me dedicar mais ao trabalho, vou ganhar mais dinheiro porquê é preciso colocar meu filho na faculdade", tem também a compra do carro novo, ou talvez aquele curso de línguas prometido em resoluções anteriores e nunca iniciado. Coisas das mais diversas, mas tudo sempre nos debruçando sobre as coisas que não proporcionamos a nós e aos “nossos” no ano que acaba.

Aí vem a provocação. Se realmente realizássemos, todos, uma profunda avaliação do que fizemos e principalmente do que não fizemos no ano que se vai, enxergando-nos como parte de um todo, parte de um coletivo, desfocando o olhar dos nossos umbigos, quase sempre flácidos pela falta da academia de ginástica não iniciada, talvez no lugar de resoluções de dietas, compra de carros novos, cursos de línguas, daquela tão sonhada viagem ao exterior, estaríamos resolutos a verdadeiramente não errar mais os erros egoístas errados nesse e em vários outros anos de nossas vidas.

Estaríamos resolutos a talvez em 2007 estabelecer outras metas. Metas como visitar e ajudar uma creche ou um orfanato, levando às crianças que lá vivem sem pais ou família uma palavra de afeto e esperança, esperança de um ano novo, de um ano melhor, de uma vida melhor.

Estaríamos resolutos talvez em sermos mais tolerantes e carinhosos com nossos filhos, pais, parentes, incluindo aí os cunhados, amigos e colegas de trabalho, distribuindo algo que nada nos custa e tanto faz bem, afeto, sorrisos, bons dias verdadeiros, abraços, coisas que nada nos custam, coisas do ser.

Estaríamos quem sabe decididos a realizar algum trabalho voluntário para uma instituição social ou talvez a abraçar uma causa como a defesa do planetinha onde vivemos, tão esquecido e maltratado nos anos que vem e que vão, maltratado por erros novos e o que é pior por erros velhos, pela ignorância do homem, que juntamente com os vírus, são os únicos seres que destroem e matam seu hospedeiro.

Aí sim, estaríamos nesse processo de descobrimento dos valores reais e das realizações verdadeiramente importantes, comemorando não apenas a chegada do ano novo, que a bem da verdade, trata-se apenas de uma convenção da humanidade para organizar as atividades da sociedade criada por um Papa chamado Gregório em 1582, mas estaríamos comemorando a chegada do homem novo dentro de cada um de nós.

Vamos parar e refletir sobre o que podemos fazer de bom, de novo, de diferente, não apenas a nós, mas ao próximo, ao nosso irmão em humanidade, dando um pouco do que tivermos a dar, e olhe que sempre temos, por menos que tivermos, sempre temos algo a dar, pois nesse país ainda tão injusto com a maioria das pessoas, muitos têm menos, muito menos que nós.

Vamos buscar fazer um 2007 mais fraterno, de mais paz, solidariedade, justiça, amor, e a partir do espocar dos fogos da zero hora do dia 01 de janeiro de 2007, deixemos explodir dentro de nós esses sentimentos nobres, fazendo nascer nos nossos corações, novos homens, que se renovem todos os dias, todo o tempo, todos os anos de nossas vidas.


Feliz Homem Novo, Feliz 2007.